O LADO FILANTRÓPICO DE MAMEDE PAES MENDONÇA


o preço vende mais


O lado do empresário de sucesso, hábil negociante e um estrategista nato, o Brasil inteiro tem conhecimento. Agora o seu lado humano e filantrópico pouca gente conhece, com exceção talvez de um de seus melhores amigos durante 34 anos, o empresário alagoano Jessé Oliveira, 75, dono de empresas do ramo de laticínios, hoteleiro, automotivo, entre outras.

"Mamede Paes Mendonça já fazia filantropia na Bahia antes mesmo da filantropia virar moda", diz. Maior colaborador das Obras Sociais de Irmã Dulce desde o início, a quem doava dinheiro e alimentos, e de outras instituições como o Hospital Aristides Maltez, Mamede Paes Mendonça, morto há 11 anos, construiu ainda a maior e melhor creche de Salvador, na Avenida San Martim, batizada pelo governador da época, João Durval, com o nome de sua mulher, Lindaura Andrade Mendonça. "Era uma creche padrão. Tudo que Dona Yeda (mulher de João Durval) precisava falava com ele, inclusive essa creche foi idéia dela na época em que administrava as Voluntárias Sociais no governo do marido", que administrou a Bahia de 1983 a 1986.

Jessé conta que antes mesmo de se tornar uma figura visível, Irmã Dulce costumava ficar horas até tarde da noite à espera de Seu Mamede na primeira loja construída por ele em Salvador, na Baixa dos Sapateiros. "Ela fazia o pedido, ele às vezes reclamava, mas no final acabava dando o que ela queria. Mamede ajudou muito Irmã Dulce, a própria sobrinha dela Maria Rita pode comprovar, só que não saía nada na mídia. E com isso Calmon de Sá e Norberto Odebrecht acabaram tendo mais destaque do que ele em matéria de doações. Ele doava muito mais do que os dois mas não aparecia porque não tinha o filho que o representasse", conta Jessé.

O empresário lembra que, além de dinheiro, Seu Mamede doava alimentos a Irmã Dulce e oferecia a Kombi para apanhar as doações nos seus supermercados, mas ninguém sabe disso. O Aristides Maltez, segundo ele, também foi um grande beneficiário da benevolência de Seu Mamede. "Ele dava contribuições mensais em dinheiro e quando o hospital precisava ou estava em dificuldade financeira ele cobria o débito. Em muitas ocasiões o hospital podia fechar e ele salvou. Uma pessoa dessa é desconhecida. Quando é um jogador de futebol que faz caridade todo mundo fala", pondera. Jessé conta que a vizinhança do escritório de Mamede Paes Mendonça, na Praça Deodoro, na Cidade Baixa, era povoada de gente pobre que acabava sendo alvo da bondade do empresário. "Mamede era uma pessoa bondosa. A dona Lindaura mandava sanduíches para ele fazer lanche. Ele acabava dando às pessoas que pediam esmola na porta do escritório", lembra, revelando um lado humano e solidário do empresário sergipano que também poucos conhecem. "Ele era tão grato às pessoas que tirava os domingos para visitar nos hospitais os representantes comerciais que tinham contato com ele, quando doentes, quer fossem de empresa grande ou pequena".

Para exemplificar o quanto se preocupava com as pessoas, sobretudo com os idosos, Jessé conta um episódio acontecido na época em que estava sendo construído o hipermercado Paes Mendonça da Barra da Tijuca no Rio de Janeiro. "Durante a construção da loja Mamede viu uma escada de acesso que não gostou por ser muito alta. Ele chamou o responsável pela obra e pediu que a escada fosse destruída e fosse colocada uma rampa no local, justificando que as suas lojas eram freqüentadas por muitos idosos que teriam dificuldade em subir aquelas escadas. O trabalho não foi feito. No dia da inauguração um homem idoso tropeçou na escada e caiu. Quando Mamede viu aquilo se revoltou e mandou quebrar na hora a escada".

O lado humano de Mamede Paes Mendonça era muito grande, de acordo com Jessé. "Quando ele ia almoçar, no carro, ouvia o programa de Raimundo Varela no rádio, que sempre pedia cadeira de rodas. Ele falava com o motorista Sérgio: "Anote aí para eu mandar as cadeiras de rodas". Quando chegava ao escritório pedia a dona Enaura, sua secretária durante muitos anos, para providenciar as cadeiras de rodas e enviar para o programa".

Sua visão empresarial era também muito acentuada. Para ter uma idéia, Jessé conta que as primeiras lojas de supermercado do Rio e São Paulo foram informatizadas por Mamede Paes Mendonça na década de 80. Nenhuma delas até então era informatizada. Ele foi o pioneiro nesse aspecto.

Amigo de fé - A longa amizade entre Jessé e Seu Mamede começou há mais de quatro décadas, como ele mesmo conta. "Era representante da Itambé para o Norte e Nordesteb e há 43 anos cheguei aqui em Salvador com uma lata de manteiga e outra de leite em pó na mão. Vim de carro na época e fui estar com Seu Mamede. Veja só a sua visão empresarial. Ele pegou a lata de manteiga e falou: "Vem de Minas não é?". Ele era gago: "E-eu co-conheço essa ma-marca Itambé". Então pegou a manteiga e mandou para os dois sócios na época, o Pedro Oliveira e o João Andrade. Um disse: "Isso aí, tio, não vai sair". O outro retrucou: É muito amarela". Mas Seu Mamede deu a palavra final: "E eu vou comprar". E comprou naquela época, se não me engano, 500 caixas de manteiga e 200 de leite. Depois ele terminou comprando 70 mil caixas e queria comprar o dobro, mas não tinha produção. Ele comprou isso para não ficar refém da Nestlé que na época era o único fabricante". E completa: "Ele era muito inteligente. Me propôs vender em grande quantidade com 120 dias de prazo para pagar pelo mesmo preço de à vista. Faltava leite em todo Brasil, menos na Bahia. Mamede chegou até a emprestar leite a Arthur Sendas no Rio de Janeiro".

A amizade entre os dois se fortaleceu, segundo ele, porque Seu Mamede não tinha ninguém que o orientasse honestamente. "Era uma pessoa inculta, não sabia nada de Direito, de nada. Mas era um homem de uma visão extraordinária", confidencia o empresário, que confessa ter aprendido também muitas coisas com ele, a exemplo da forma de negociar.

Jessé discorda que a causa da quebra das empresas Paes Mendonça se deveu à aquisição do grupo Disco no Rio de Janeiro, ao contrário do que se comenta no mercado. "O problema com as empresas de Mamede foi exclusivamente uma questão de cultura. Uma pessoa semi-analfabeta não tem capacidade de gerir nem a metade de uma empresa do porte da de Mamede hoje em dia. À medida que começou a informatização das empresas ele se perdeu", acredita.

O empresário que morou em Minas Gerais e 23 anos no Rio de Janeiro, vinha constantemente à Bahia e já tinha construído uma casa em Salvador, onde ficava ao passar férias na cidade. Quando se mudou para a capital baiana, há 20 anos, motivado pelo crescimento dos negócios na região, já era casado e pai de quatro filhos, três homens e uma mulher, dois advogados e dois engenheiros, todos nascidos em Minas. Tem também seis netos, entre 3 e 18 anos, sendo duas mulheres e quatro homens. Apesar de não ter formação superior - fez somente até o primeiro ano de Contabilidade e abandonou - ele lê muito, e se diz autodidata.

Viaduto Comendador Mamede Paes Mendonça

Justamente para prestar uma homenagem a tudo que o empresário fez pela Bahia, a Câmara Municipal de Salvador aprovou projeto de lei de autoria do vereador Sérgio Carneiro (PT), eleito deputado federal, propondo dar o nome de Mamede Paes Mendonça ao viaduto que está sendo construído na Avenida Tancredo Neves, centro econômico de Salvador.
O filho Jaime Paes Mendonça se disse bastante sensibilizado pela homenagem ao Seu Mamede, como era conhecido, e que será um orgulho não só para ele, mas também para a toda sua família. Jaime é o caçula dos filhos do casal Mamede e Lindaura Andrade Mendonça e por muitos anos foi diretor comercial do grupo Paes Mendonça, até se desligar para montar o seu negócio próprio em Juiz de Fora, onde fundou a rede de supermercados J. Paes Mendonça Ltda.

Atualmente, após se submeter a algumas cirurgias, inclusive nos Estados Unidos, Jaime toca a sua vida empresarial e os seus negócios em Salvador. As Lojas da empresa J. Paes Mendonça foram vendidas e hoje ele tem participação nos aluguéis dos prédios. Com relação ao grupo Paes Mendonça S/A, Jaime informa que continua a ser feito o inventário e o espólio está sendo administrado pelo seu irmão, José Augusto Andrade.

A empresa continua com matriz na Praça Conde dos Arcos, em Salvador e o seu contencioso está sendo equacionado. As lojas do grupo hoje pertencem ao Pão de Açúcar em sistema de arrendamento de 15 anos, com direito a compra no final desse prazo.
COMENDADOR - Mamede Paes Mendonça foi agraciado com o título de comendador, pelo presidente de Portugal, Ramalho Eanes, tendo sido condecorado em solenidade no Gabinete Português de Leitura, em Salvador.

55 anos de Paes Mendonça S/A

Este ano, Paes Mendonça completou 55 anos, já que começou a operar na Bahia em 1951, quando Seu Mamede mudou-se de Aracaju para Salvador, em busca de novos horizontes e se instalou na Praça Marechal Deodoro, no Comércio, no denominado ramo de secos e molhados. Na realidade, era uma extensão da empresa que já operava com sucesso na capital sergipana.



A história de Paes Mendonça se confunde com a do seu fundador, Mamede Paes Mendonça. Ele começou sua vida empresarial no povoado de Serra do Machado, no município de Ribeirópolis. O ano era o de 1936 e ele estava com apenas 21 anos. Ele e o irmão Euclides, mais velho, juntaram 2.700 réis e montaram uma pequena padaria. Ele entrou com 1.200 réis e Euclides com 1.500.



A trajetória empresarial de Seu Mamede, como ficou conhecido no Brasil e exterior, continuou em Ribeirópolis, sede do município, já com um armazém e ainda em sociedade com o irmão Euclides. Sempre buscando novos horizontes, em 1942 se mudaram para Itabaiana. O armazém de Ribeirópolis foi vendido para o também já comerciante, o irmão Pedro Paes Mendonça, que anos depois fundaria o Bompreço com o filho João Carlos Paes Mendonça.



Procurar lugares maiores e mais desenvolvidos comercialmente foi sempre a tônica de Seu Mamede. Por isso em 1947 separou do irmão Euclides e seguiu para Aracaju. Aí o Brasil foi o seu destino. Depois de crescer a sua rede de supermercados em Salvador, chega em 1984 a São Paulo com um hipermercado. Rio de Janeiro e Belo Horizonte vieram em seguida.



O grupo Paes Mendonça na década de 90 enfrentou séria crise financeira, proveniente da compra da rede carioca o Disco. Conta-se que no auge da maior crise que enfrentou teria dito a diretores e assessores que lhe aconselhavam a pedir concordata: "Vendo a minha última loja, mas não peço concordata".



Nascido em 05 de agosto de 1915, em Serra do Machado, Mamede Paes Mendonça morreu aos 80 anos, em São Paulo, no dia 21 de outubro, vítima de um câncer, dois dias depois foi enterrado em Salvador.

Revista: Super Revista
Ano 13, nº 136, Novembro de 2006
Órgão Oficial de Divulgação da Associação Bahiana de Supermercados.